domingo, 31 de julho de 2011

Lápis, papel e emoção


             Um dia descobri que não gosto de livros, não me apego a eles. Eu vicio em escritores, em frases, em termos, nas idéias transportadas por cada palavra, na função daquela palavra ali naquele exato lugar, no contexto. Ah, eu vicio mesmo, no jogo da escrita. Na arte que as palavras têm de emocionar!
        Possuo muitos rascunhos de textos inacabados. Acaba que exijo tanto de mim que sempre acho que não está bom. Rascunho de novo. Esqueço. Depois, quando menos espero, os encontro no fim da minha agenda, os meus rabiscos mais rabiscados. Uno um ao outro e logo: tenho um texto do meu agrado.
        Estou longe de Olavo Bilac e perto de Chico Xavier, pois: escrevo quando sou tomada pela emoção, e não por arte.

É do passado que eu sinto a falta do futuro


           Conotativamente meus olhos enchem d’ água, meu coração intumesce, e na minha mente começa a passar um filme. O cheirinho de pipoca ainda é o mesmo, mas o sabor mudou.  A trilha sonora é a mesma, mas o ritmo mudou. Eu também ainda sou a mesma, mas a minha vida mudou. Tudo mudou de forma tão preguiçosa que quando eu percebi, as mudanças já eram grandes demais.

       Eram tardes tão doces aquelas em que eu passava a brincar, rir e soluçar. Eram manhãs felizes aquelas em que eu passava em plena felicidade, pelo simples fato do sol brilhar. Eram noites aconchegantes aquelas em que eu passava a ouvir historinhas que não eram contos de fadas, mas eu achava os melhores contos do mundo, pois eram com eles que o sonho chegava rápido. Eram madrugadas assustadoras aquelas em que eu passava com medo do escuro.

         Foi em um dia desses que eu estava a olhar fotos de antigos colegas de classe do primário, a nostalgia de lembranças veio à tona. Recordava-me de como éramos felizes, de como nos dávamos bem, do quanto éramos confidentes, de quando riamos sem parar, das vezes em que brigávamos, da adrenalina que sentíamos ao aprontar alguma traquinagem, de quando nos abraçávamos, quando chorávamos todos juntos e até mesmo do nosso juramento infantil e inocente de que nunca iríamos nos separar. Lembro-me incansavelmente dos nossos planos de passar a vida toda juntos.

         Com vontade de voar, eu fui umas das primeiras a desfazer-se daquele enorme nó de afetos, de tudo que havia sido construído e a deixar todos. Só foi um “tchau”, não dei “adeus” eu nunca vou querer usar esse termo, me soa fortemente triste, é como se ao ouvi-lo eu tenho a plena certeza que o sinônimo é: “até nunca mais”. E foi isso, dei um afetuoso “tchau” com promessas incessantes de que os visitaria sempre.

         Eles ainda eram muitos, eles ainda eram uma turma, eles ainda tinham uns aos outros. E eu era uma apenas, uma e só. Não era mais uma simples marinheira de um grande navio, agora eu teria de capitanear solitariamente o meu próprio navio. O desafio foi aceito, me pus em alto mar. Fui capitã da melhor forma que podia, enxergava a chance de encontrar novas fórmulas para mim. Enfrentei grandes tempestades na rota do meu navio e enfim vieram as mudanças de estações.

         No Porto em que ancorei, encontrei bons marinheiros e outros capitãs. Já não era mais uma e só, eu novamente era muitos. Passo a passo fui rindo novamente, abraçando novamente, confidenciando novamente, chorando novamente, brigando novamente, sendo feliz novamente, amando novamente. Levantei toda uma vida paralela aquela puramente não foi modificada pelas estações do tempo...

         E foi nesse mesmo dia em que eu estava a olhar as fotografias dos antigos colegas de classe, eu vi o quanto aquela turma mudou, havia diminuído e que de alguma forma eu deixei de ser importante à ela e o quanto ela ainda significava para mim. Talvez a culpa de muitos acontecimentos tenha sido minha, talvez!

         De um tempo pra cá, passo a me perguntar todos os dias: “Onde você ainda se reconhece, na foto passada ou no espelho de agora?” E todos os dias a resposta foi o som de uma respiração bem profunda, o meu silêncio. Entretanto, hoje a reposta não foi a de sempre, respondi diferente, respondi sutilmente: “deixa o amanhã dizer”.